A presença de homens gays em ordens e congregações da Igreja Católica revela uma das maiores contradições de uma das instituições mais antigas e influentes do mundo. É o que aborda o livro “A vida secreta dos padres gays — sexualidade e poder no coração da igreja”, escrito pelo especialista em sexualidade e religião e ex-seminarista Brendo Silva.
A obra reúne relatos pessoais do autor e mergulha em um tema conhecido nos bastidores da Igreja, mas que raramente ganha espaço no debate público: a convivência entre a doutrina oficialmente conservadora e a vivência da homossexualidade dentro do clero.
Descobertas desde a infância no ambiente religioso
Brendo relata que começou a perceber esse paradoxo ainda na infância, quando atuava como coroinha. “Notei que a maioria dos meninos ao meu redor era gay”, afirma. A mesma percepção se repetiu no vocacional e no seminário, onde viveu durante quatro anos.
Segundo ele, já no vocacional, era comum que adolescentes entre 12 e 14 anos trocassem cantadas e até mantivessem relações. No seminário, dos 12 seminaristas da turma, pelo menos oito se relacionavam afetiva e sexualmente com outros homens.
Um tabu ignorado, mas presente
“Sempre foi uma situação muito banal e corriqueira. Não é novidade no meio da Igreja que isso existe. Só não é falado, é tabu”, explica o autor. Para ele, essa é uma realidade que vive no silêncio institucional, embora seja visível para quem convive nos bastidores da vida religiosa.
Diferenças entre seminários conservadores e progressistas
Brendo também destaca que a maneira como a homossexualidade é tratada varia conforme o perfil ideológico dos seminários e dioceses. Nos ambientes considerados mais progressistas, há mais liberdade para que os seminaristas vivam sua sexualidade — desde que de forma discreta, sem gerar escândalos públicos.
“A regra não escrita é: viva sua vida, mas não exponha. O problema não é ser, é ser visto.”
Por outro lado, em ambientes conservadores, prevalece uma cultura de repressão, controle e punições, o que, segundo o autor, gera ainda mais sofrimento, hipocrisia e, muitas vezes, práticas clandestinas.
Reflexão sobre poder, moral e hipocrisia
O livro não apenas traz relatos, mas também propõe uma reflexão crítica sobre como a instituição lida com temas como sexualidade, desejo, poder e controle. Brendo argumenta que a contradição entre discurso e prática fragiliza a autoridade moral da Igreja e gera sofrimento tanto para membros do clero quanto para fiéis.
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